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Trabalhando com um iPad nas férias

O título acima é enganador: em janeiro de 2021 eu não estava de férias; ainda não completei um ano no meu emprego atual de professor. Porém, sem compromissos de aulas e de pesquisa, eu e minha esposa quisemos aproveitar esse período para visitar familiares dos dois lados – principalmente para todos babarem em cima do bebê da família. Rompemos o isolamento social que mantivemos desde o início da pandemia, tentando, ao chegar nos lugares, ficar o mais isolado possível.

Para honrar meus compromissos com meus alunos e com o meu departamento, já antevendo a volta das aulas, eu trouxe o meu iPad comigo nesses 800 km entre Cascavel, Curitiba e Florianópolis. Foi ele que me permitiu avançar, que seja aos poucos, nos meus projetos, tendo uma rotina mais leve e criativa. Com o carro cheio de artigos de bebê, não achei que caberia o peso adicional de um laptop…

Meu setup de trabalhar nas férias

Em três casas diferentes e muitas mesas e sofás, eu tive de substituir o meu escritório cuidadosamente montado por isso:

Sinceramente, não estou com saudade da minha mesa

Esse aparelho acima é o iPad Air de 3ª geração, 256 GB de armazenamento, 10,5 polegadas, com conexão apenas Wi-Fi (sinceramente, meu próximo iPad vais ter conexão celular). Ele está sempre montado em uma capa com Smart Keyboard. Geralmente do lado desse conjunto está o meu caderno.

1. É muito caro. 2. É muito bom.

O que não aparece nas imagens acima é o Apple Pencil de 1ª geração e AirPods, sempre para escutar Deezer. Tudo isso foi comprado com o desconto educacional da Apple depois que minha esposa finalmente me autorizou a fazer esse gasto, cansado de me ouvir falar em comprar um iPad para trabalhar há mais de 3 anos.

O que posso fazer num iPad

Afinal, é possível fazer trabalho de verdade? Essa é uma discussão corrente e que está perto de ser solucionada, à medida que os tablets vão ficando mais poderosos em termos de hardware e software. Sim, é possível – pelo menos alguns tipos de trabalho.

Trabalhar com documentos

O app mais essencial no meu iPad é o Documents da Readdle, que não sei como não é mais divulgado; é a melhor maneira de navegar por documents salvos no OneDrive, Dropbox, Google Drive, iCloud, ou mesmo na memória interna do iPad, e ainda possui um editor de PDF integrado. Usei esse app para criar pastas para alguns trabalhos que estou criando para os alunos, duplicar arquivos e mover entre diferentes locais, juntar documentos, apagar páginas.

Com certeza, o meu app preferido para iPad: Documents da Readdle

Nesse período de férias, eu resolvi testar o modo Pro, que permite, entre outras coisas assinar documentos:

A propósito: o PDF que foi assinado foi exportado a partir do Word. A minha irmã recentemente comentou que descartava comprar um laptop Apple por “mas eu preciso do Office”; essa fase de incompatibilidades já acabou. Os aplicativos da Microsoft para dispositivos Apple são bastante capazes.

Preparar aulas

Nesses tempos de aulas remotas, a minha tarefa básica é preparar apresentações. Eu me surpreendi em como o Keynote para iPad é tão capaz quanto a versão para macOS.

Quem souber deixa nos comentários

Para me guiar nas apresentações, eu digito notas no Notion. Nessas viagens eu não tinha os livros que tenho na minha pequena biblioteca, mas consegui escrever algumas notas que estavam mais frescas na cabeça e consultando alguns PDFs (usando o supra-citado Documents).

Sim, nós somos engenheiros, nós discutimos válvulas

Como diz Shawn Blanc, porém, o fato do Notion para iPad não exibir os itens completos na visualização de calendário (apenas exibe que existem itens em um dado dia) é uma insanidade.

Parte do trabalho de preparar aulas é preparar planilhas de notas, para me ajudar a avaliar trabalhos e apresentações. O Numbers para iPad é ótimo. A integração com provedores de documentos é sensacional; ao navegar no app, só aparecem habilitados os arquivos que podem ser abertos no Numbers:

Sim, eu quero deixar bem claro para meus alunos o que eu espero de um trabalho

Tomar notas de livros

A habilidade de colocar apps lado a lado no iPad permite um fluxo de trabalho perfeito; de um lado o Kindle, com trechos sublinhado, e do outro o Bear, onde vou escrevendo minhas impressões com minhas próprias palavras.

Aguardem um post completo sobre como aprendi a usar o Moodle

Publicar posts

Tanto o presente texto quanto o último foram escritos inteiramente em um iPad.

Esses posts todos são planejados com o ótimo MindNode.

De boas, sonhando em ser um blogueiro profissional

Como me concentro

Para me guiar nesse processo, eu tenho um sistema no Todoist, que vou descrever no próximo post, e uso o Focused Work como um cronômetro; consigo criar um timer para trabalhar concentradamente por meia hora, uma hora, duas horas, dependendo do quanto tempo tenho.

O que quero que melhore

Eu gostaria muito de poder invocar Atalhos pelo Smart Keyboard. É algo que tenho pesquisado mais e mais à medido que uso o iPad com mais frequência. Por exemplo, tenho um atalho para criar uma nota no Bear com aquele time stamp no título; gostaria de, enquanto escrevo uma nota, já conseguir criar outra, sem precisar ir no app de Atalhos.

Como falei, o Smart Keyboard é ótimo, mas eu queria ter mais angulações para trabalhar, e de preferência com um layout em português.

A única angulação possível.

E por fim, quero widgets na tela inicial, pelo amor de Deus.

Acho que vou me divertir muito com meu iPad em 2021…

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Você não precisa de uma tela Retina

A minha namorada tem um celular Nokia antigo, daqueles de flip ainda
(lembram?). Não tem nenhum recurso a não ser os básicos: telefone,
mensagens, alarmes, uns joguinhos.

Os mais jovens dizem que o fato de ela ter um telefone velho assim “é
paia demais”, ou algo assim, não estou por dentro das gírias novas.
Apesar das críticas, é com esse celular que ela fala quase todo dia com
a mãe dela, a 800 km daqui. É com esse celular que ela se comunica com
os sobrinhos e irmãos que moram longe. É com esse celular que ela troca
mensagens comigo.

Ela não está nem aí para o que está acontecendo no Twitter (e eu,
namorado ruim que sou, continuo checando-o mesmo quando estou com ela).
Ela não ri das fotos com legendas engraçadas no Instagram. Ela consulta
o Facebook com calma, no computador dela. Ela não precisa consultar o
email quando está na fila do mercado.

Ela é formada numa universidade, trabalha, já morou em algumas cidades
diferentes, vai a festas, tem amigos, tem um namorado. Tudo isso sem um
smartphone. E ela diz que só vai comprar um outro celular quando este
estragar. Considerando que estamos falando de um Nokia antigo, isso quer
dizer nunca.

Namorá-la é com certeza a melhor coisa que me aconteceu nesse ano, e,
apesar de naturalmente não ser só por causa disso, ela é um lembrete
ativo do que queremos dizer quando precisamos de algo.

Você é um animal. Você precisa de água e comida. Precisa dormir. Precisa
fazer exercício. Precisa urinar e defecar.

Você também é um ser humano. Precisa ter cultura, sentir-se pertencente
a algo, relacionar-se com alguém (seja esse alguém Deus), integrar-se na
sociedade, estimular-se intelectualmente, descobrir a sua vocação.

O que você não precisa é de uma tela Retina.


Eu me formei em engenharia, então para mim a tecnologia é um meio de
vida. A minha profissão é criar tecnologia, então o leitor pode ter
certeza que não quero dizer que temos que abandonar toda tecnologia. O
que prego é que temos de ter uma atidude racional em relação a ela.

Meu tema de mestrado é a refrigeração, a ciência de produzir frio. Uma
geladeira é necessária? Depende. A humanidade viveu muito mais tempo sem
refrigeradores do que com eles. Mas eles certamente ajudam. Com uma
geladeira você precisa ir menos vezes ao mercado porque os alimentos
duram mais. Você se refresca com a cerveja no verão. Você pode preparar
a comida na véspera da festa para poder aproveitar com seus amigos. Tudo
isso é ótimo. Tempo e dinheiro poupado com a ajuda de uma geladeira
podem ser usados para outras coisas.

Tudo bem, os benefícios de ter um refrigerador são tantos que você
decide que precisa de um. Mas você não precisa de uma geladeira de
inox com duas portas. Você quer uma e pode comprar. Ótimo.

Da mesma forma, a minha namorada, por decisão própria, resolveu que não
precisa de um iPhone ou um Galaxy S4. Ela precisa manter contato com as
pessoas importantes na vida dela (eu humildemente arrisco me incluir
nesse grupo), e o aparelho que ela tem em mãos cumpre essas funções
perfeitamente. A tecnologia, nesse caso, está cumprindo o seu papel, de
resolver um problema real.


Nos últimos tempos, eu ando me cansando do lado mais podre do mundo
Apple. Desde o lançamento dos últimos modelo de iPad, só choveram
resenhas das mais aburdas, de como ele é mágico, de como dá vontade de
chorar de tão leve que ele é, de como ele se integra a sua mão. Não há
um dia que eu não veja um artigo comparando o iPad Mini ao iPad Air. E
podcasters e blogueiros famosos estão dizendo que vão comprar um iPad
Mini porque finalmente ele vai ter tela Retina e, afinal, não dá para
trabalhar sem uma tela Retina.

Eu tenho um MacBook Pro, modelo 2011. Ele não tem tela Retina. O
computador, além de lindo e bem construído, tem mais memória,
processador e armazenamento do que eu preciso, e o sistema operacional é
ótimo, rápido e robusto. E, mesmo sem a tela Retina, eu estou
trabalhando nele todo dia! Eu sou ou não sou o máximo?

E o mais importante de tudo: eu comprei um MacBook não porque eu
precisava dele, mas porque eu queria.


A Luana Oliveira escreveu um ótimo artigo comparando a
tecnologia à religião:

Quando se chega ao ponto de tentar convencer outras pessoas de que o
produto X é melhor, de que os aplicativos ABC são melhores, quando
gera inimizades porque determinada pessoa prefere outra plataforma, o
que isso te lembra? Pra mim isso se assemelha muito à religião.
Normalmente os discípulos ficam cegos para outras possibilidades e só
têm olhos e ouvidos para aquela religião (ou marca, no caso da
tecnologia). Tudo o que não pertence a essa condição é praticamente
demonizado.

Ela está certa. Quando se faz parte do mundo de usuários Apple, e se
quer manter-se informado, é impossível não ser bombardeado com artigos
fanáticos. O mais interessante de tudo é que esse culto se torna tão
arraigado que discutimos apps pelos apps em si, e não pelo que eles
fazem. Estamos rodando testes de velocidade em um iPad sem pensar no que
ele pode ser usado.

Há algum tempo, li um artigo do Michael Shechter que me marcou
profundamente. Ele se referia a um episódio do podcast Enough em que
Patrick Rhone falava que deveríamos pensar nas ações, e não em
apps:

When trying to figure out how to improve the way you work, Patrick is
right. You shouldn’t start with the app. It is indeed about the action
you want to take, but—at least for me—a big part of that process is
taking a step back in order to find the right tool or tactic to help
me to accomplish a necessary actions. Ultimately it’s about creating
processes that ensure those necessary actions happen.

Precisamos urgentemente parar de delirar a cada vez que a Apple (ou
outra empresa) lança um produto novo e começar a consumir tecnologia de
maneira inteligente. O que estamos fazendo com esses aparelhos
excelentes que temos à disposição


Há algum tempo, eu falei que ia fazer mais resenhas de apps. Bem, eu
mudei de ideia.

Eu quero discutir tecnologia, e a nossa relação com ela. Gosto desse
tópico (tanto que, repito, escolhi uma carreira que estuda e desenvolve
tecnologia). Mas quero falar de assuntos relacionados: ciência,
produtividade, criatividade, desenvolvimento pessoal. E quero fazer
artigos longos, opinativos.

Apps são um meio, e podem servir de exemplo para alguma ideia, mas não
quero escrever um testo centrado num aplicativo. Assim, não vai mais
haver resenhas de apps. As que escrevi foram um teste, e foram
interessantes. O que eu não quero é me juntar ao culto Apple; eu sou
apenas um usuário, e não quero converter ninguém. Quero que as pessoas
usem o que for melhor para elas.

Para mim, o ecossistema Apple está funcionando bem. Todos os meus
aparelhos são de dois anos atrás e eles estão ótimos. Eu não preciso
de nada melhor. Eventualmente, eu vou trocar de aparelho. E talvez eu
compre um com tela Retina. Ou talvez não. Talvez eu volte pro Linux.
Talvez eu resolva experimentar um Android.

Eu não quero ser um fanático. Quero apenas fazer o meu trabalho,
continuar escrevendo, continuar me comunicando. E quero passar mais
tempo com minha namorada e menos tempo conferindo o Twitter.

Porque isso é o que importa.