Além de ímãs, Termodinâmica, refrigeradores, regeneradores e todos esses maravilhosos assuntos que formam o tema do meu doutorado, carreira tem sido a minha maior obsessão intelectual.
Isto pode ser um sinal de maturidade. Quando fazia o mestrado, enxergava-o mais com uma extensão natural da minha graduação. Praticamente todas as pessoas com que conversei antes de iniciar o mestrado concordavam em um ponto: o tempo gasto em um mestrado é baixo se comparado aos benefícios que ele traz, o que se torna ainda mais verdade numa economia com menos contratações e onde uma qualificação maior faz a diferença. Você sai do mestrado aos vinte e poucos, tem uma formação a mais e experiência na condução de um grande projeto; depois do mestrado, ainda existem muitas opções de carreira disponíveis, para a maioria das áreas.
Quando refleti sobre fazer o doutorado, porém, percebi que isso se tratava de uma decisão de carreira muito significativa. Eu terminaria o meu doutorado com 30 anos e nenhuma experiência em indústria; fazê-lo então quase que representa um comprometimento com o mundo acadêmico (embora, naturalmente, existam casos de sucesso de doutores que foram para o mundo empresarial e industrial). Para ser bem sucedido como acadêmico (professor e/ou pesquisador de uma boa instituição de pesquisa ou universidade), fazer um bom doutorado é necessário (mas não suficiente), e vem seguido de muitos desagios. Como guiar a minha carreira, aumentando o meu sucesso e sendo feliz no processo? O que determina uma carreira bem sucedida?
So Good They Can’t Ignore You foi escrito por alguém em situação próxima a minha: um estudante terminando o seu doutorado e querendo saber o que ele deve fazer para encontrar uma carreira que ele ame — e talvez seja por essa proximidade que eu me identifico tanto. O autor, Cal Newport, agora é já um professor bem estabelecido, e esse nome não deve ser estranho a leitores de FabioFortkamp.com, tal o número de vezes que eu cito o seu ótimo blog, Study Hacks. O título (em tradução livre, Tão Bom Que Eles Não Possam Ignorá-lo), vem deste clipe de uma entrevista de Steve Martin:
Este livro prático (com muitas discussões baseadas na Economia e na Psicologia) defende a ideia de que uma carreira de sucesso, que você ame, não é contruída baseada no sonho de “ir fazer o que se ama”, mas na ideia de quando você se torna realmente bom no seu trabalho você aprender a amar o que faz. Reparar que esta é uma tese dividida em dois pontos centrais:
Primeiramente, ass coisas pelos quais nos declaramos apaixonados, como música, esportes, religião, artes etc não são carreiras fáceis a não ser que você seja absolutamente brilhante. Este, aliás, é um ponto sutil do livro; sim, existem casos de pessoas que eram apaixonadas por alguma coisa e ganham a vida fazendo isso, mas eles são mais raros do que se pensa e representam casos extremos. Se você é fanático pelos Beatles, por exemplo, dificilmente consegue contruir uma carreira em cima disso, a não ser que seja algo especial — ou você toca igualzinho ao George, ou descobriu um novo ponto sobre a biografia deles… Adicionalmente, ter de trabalhar em cima de uma paixão tão profunda talvez até faça você gostar menos desse assunto. Ou seja, a maneira de construir a carreira ideal não é indo atrás das suas paixões.
Mas qual é a maneira, então? Na realidade, é difícil ter muito controle sobre a carreira em vamos parar. Eu queria cursar Jornalismo até os meus dezessete anos; mudei de ideia às vésperas da inscrição no Vestibular e agora estou fazendo Doutorado na área de Refrigeração. Mesmo que você “caia de para-quedas” em uma carreira, Newport defende que é possível você desenvolver gosto pelo que faz, e o seu argumento é bastante microeconômico: nas suas entrevistas, o autor percebeu que os profissionais realmentes de sucesso que se declaram felizes profissionalmente (em áreas diversas como programação, investimentos, medicina, construção de pranchas se surfe e redação de programas de TV) têm em comum o controle sobre a sua carreira e impacto sobre os outros. Essas condições são difíceis de encontrar, então você precisa se diferenciar para ter acesso a elas. E a melhor maneira de se diferenciar é através da aplicação sistemática do trabalho árduo, deliberado, esticando as suas habilidades além de um nível confortável é o que tem mais chances de lhe fazer ter sucesso. Como Martin diz no vídeo acima, essa conclusão é óbvia e sem graça a tal ponto que as pessoas não querem ouvir, mas é mais importante que tentar ser um gênio, ou conhecer alguem famoso, ou conseguir muitos seguidores.
O ponto mais curioso em relação à livro é que ficam evidente que o autor é professor universitário. Todo o livro é escrito de forma muito didática, com “leis”, “regras”, “teorias”, que facilitam bastante o entendimento. Newport muitas vezes para, lembra do que já foi dito, revisa os conceitos — e não consegui esconder o sorriso e perceber que era um (bom) professor conversando comigo.
CGP Grey recomendou So Good… como uma das bases para o seu entendimento do que é uma vida de sucesso. Acho que a época em que estou é a ideal para pensar seriamente nessas questões, mas também acho que, independente da idade, se o leitor precisa refletir sobre a sua carreira, se está na dúvida sobre o que fazer, e se quer simplesmente ser mais feliz no trabalho, pode se beneficiar da leitura desse livro.
5 respostas em “Resenha: So Good They Can’t Ignore You”
[…] minha namorada reclamou que a minha resenha de So Good They Can’t Ignore You ficou meio incompleta e sem muitos exemplos […]
[…] tornar raro e valioso para conseguir as melhores condições de trabalho. Para mais detalhes, veja a minha resenha. Esse livro proporciona um belo contraste com A Arte de Fazer Acontecer (primeiro item dessa lista) […]
[…] seu livro anterior, So Good They Can’t Ignore You (que já resenhei), Cal Newport defende que a satisfação profissional é derivada não do clássico “fazer o […]
[…] usar a terminologia newportiana, geralmente essas dicas são dadas por quem já tem capital de carreira suficiente (mesmo que sejam […]
[…] escrever coisas assim, eu preciso treinar. Assim, também em relação a concursos passados, eu não tenho apenas tomado notas, mas tenho […]