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Uso básico de pytest e suas fixtures

Em primeiro lugar, o que diabos é pytest e por que eu me importo com isso?

A biblioteca pytest é um pacote de testes em Python. Para que serve? Como eu sei que tenho muitos leitores na área acadêmica, acho que vou me fazer entender: você escreve seus projetos de programação em Python, para simulação numérica de algum problema físico, para processamento de dados, para automatizar alguma tarefa, para gerar gráficos etc. Você vai aumentando o seu programa até que não tem mais certeza de como uma parte conecta com outra. Você adiciona uma função inofensiva, e então percebe que outra, “aparentemente” não relacionada, parou de funcionar. Os arquivos que eram para ser gerados não o são mais. Os gráficos saem esquisitos. Os resultados numéricos não fazem sentido.

Testes, nesse contexto de programação, são funções adicionais que asseguram o funcionamento correto do código. Se uma determinada função, quando executada, deve sempre gerar um arquivo results.txt, então você escreve um teste que executa a função e assegura que esse arquivo existe. A cada modificação no seu programa, você executa seu teste; se ele falha, é sinal de que é preciso parar, avaliar e corrigir erros.

Neste ambiente acadêmico em que estou, não vejo muita ênfase sendo colocada em testar o seu código, o que é um contrassenso. Testes têm um sentido científico: se eles passam, então a hipótese de que o você programou representa a realidade se torna mais forte. Eles não são “perda de tempo”; é bem fácil escrever rapidamente um programa que não funciona.

Tudo o que vou falar aqui se baseia nessa minha experiência: um pesquisador que usa de programas em Python como uma ferramenta para produzir conhecimento científico.

Instalação e uso básico

Para aplicações acadêmicas, especialmente em Windows, a melhor maneira de usar Python é através da distribuição Anaconda. A biblioteca pytest já está incluida.

No espírito acadêmico de transparência, vou compartilhar exatamente como tenho usado pytest para melhorar minhas práticas de programação e, com isso, produzir resultados científicos mais confiáveis.

Tenho um projeto chamado magnet3Dpolomag. Não se preocupem sobre o que é, apenas entendam como minha plataforma de testes está organizada:

Lista de diretórios de um projeto usando pytest
A propósito, esse screenshot é do Visual Studio Code

No meu diretório raiz, além de vários arquivos, existem essas duas pastas importantes: uma pasta com o pacote em Python, com seus vários módulos, e uma pasta de testes. O diretório do pacote Python é declarado como “importável” ao conter o arquivo de inicialização __init__.py. Assim, quando esse pacote é instalado, eu posso digitar simplesmente:

import magnet3Dpolomag

e tudo que estiver no arquivo __init__.py dentro da pasta magnet3Dpolomag vai ser carregado.

A convenção de testes em Python é usar nomes de arquivos que comecem com test_, e no momento eu só tenho um arquivo geral: dentro dele existem funções que testam o correto funcionamento de magnet3Dpolomag quando parâmetros válidos são fornecidos (testar se os parâmetros passados ao programa são válidos ou não é outra história).

Como um exemplo de teste, aqui está um pedaço do meu pacote: uma classe Magnet3DModel, com uma função que faz uma transformação de dados de simulações e retorna dois vetores:

import numpy as np

class Magnet3DModel:

    def get_profile_data(self, ):
        """Return phi, B vectors at the central plane"""
        
        middle_plane = self.z_profile_1q == 0
        phi_middle_plane_1q = self.phi_profile_1q[middle_plane]
        B_middle_plane_1q = self.B_profile_1q[middle_plane]
    
        phi_vector = np.concatenate((phi_middle_plane_1q,
                                 phi_middle_plane_1q + 90,
                                 phi_middle_plane_1q + 180,
                                 phi_middle_plane_1q + 270))

        B_profile = np.concatenate((B_middle_plane_1q,
                                B_middle_plane_1q[::-1],
                                B_middle_plane_1q,
                                B_middle_plane_1q[::-1]))

        return phi_vector, B_profile

Uma breve explicação: esse “modelo”, quando é executado, armazena uma nuvem de dados nos vetores z_profile_1q, phi_profile_1q e B_profile_1q. Para esse método em particular, estou apenas interessado nos dados que correspondem ao “plano” z_profile_1q == 0. O sufixo 1q indica que se trata de dados “no primeiro quadrante”; como os dados são periódicos, eu retorno os dados “expandidos”.

Eu quero me assegurar que, quando esse modelo é executado, essa função vai retornar esses vetores conforme esperado, com valores apenas numéricos:

import numpy as np
import magnet3Dpolomag

def test_can_access_magnetic_profile():

    m = magnet3Dpolomag.Magnet3DModel()
    # executa mais instruções para simular o modelo

    phi_profile, B_profile = m.get_profile_data()

    assert (
        np.isfinite(phi_profile).all() and 
        np.isfinite(B_profile).all()
    )

Repare na semântica do teste: ao escrever esse código, eu não tenho ideia de como get_profile_data() funciona; eu apenas sei que, quando eu executar o modelo, quero poder chamar uma função que me retorne esses vetores e que estes não tenham valores não-numéricos (que poderia surgir de algum erro). Para esse fim, eu uso a função isfinite() da biblioteca NumPy, que retorna um vetor booleano que checa exatamente isso; então, eu uso o método all() de vetores da biblioteca NumPy, que vai retornar True se todos os elementos são True.

A chave de uma função de teste é o comando assert; se o seu argumento é falso, então o programa para (ou, no caso, a função de teste falha). A biblioteca pytest tem como grande característica usar esse comando, que faz parte da linguagem Python “pura”, e reportar exatamente o que deu errado, no caso de uma falha.

Testes são executadas invocando pytest em um terminal. A partir do diretório onde é executado e varrendo os subdiretórios em todos os níveis, esse comando primeiro “descobre” os testes, arquivo que começam com test e, dentro deles, as funções e classes que começam com test_. Como quase tudo em se tratando de pytest, esse processo de descoberta de testes é configurável. A biblioteca então executa todos as funções e métodos de teste e reporta, de maneira muito inteligente, os testes que passaram e os que falharam.

Este exemplo pode parecer meio tolo, então quero enfatizar o grande propósito dessa minha discussão: escrever testes me ajuda a entender um código em Python que o meu de anos atrás escreveu, e me faz pensar sobre o que ele deve fazer.

Além disso, eu não vou estar nesse laboratório para sempre, e estes programas que eu crio para auxiliar no nosso projeto ficarão de legado para a minha equipe. Cada hora gasta trabalhando numa plataforma de testes pode não gerar resultados práticos agora, mas tem consequências futuras. Os financiadores do meu projeto atual não poderiam se importar menos se o meu código está bem testado, e talvez até achem que eu deveria estar fazendo outra coisa; mas aposto que eles ficam felizes quando a próxima pessoa que trabalhar nisso (eu mesmo eu, daqui a algumas semanas) não perder dias de trabalho tentando resolver um problema que poderia ter sido solucionando mais rapidamente executando a plataforma de testes e vendo qual parte do sistema está defeituosa.

Anteriormente escrevi que um das grandes sacadas de pytest é “turbinar” o comando `assert`. Outra grande sacada é o uso de *fixtures*: funções que auxiliam os testes. Não quero nesse post fornecer um tutorial de Python ou mesmo de pytest; quero apenas [documentar de maneira resumida como estou *aprendendo*][show] a escrever testes e motivar pesquisadores a fazer o mesmo. Além da documentação da biblioteca, [*Python Testing with pytest*][pytestbook] é bem bom. No exemplo que usei acima, eu apresentei uma função de teste que simula a execução do modelo e confere alguns dados gerados por ele. E se, com base na mesma execução do modelo, eu queira testar outras condições, como outros vetores e matrizes gerados, arquivos que devem ser gravados, parâmetros que devem ser armazenados? Esse é um exemplo clássico de *fixture*: uma função que não é um teste, mas que é executada antes dos testes, e que passa informações “compartilhadas” entre eles. Além disso, é possível repetir o mesmo teste várias vezes, checando por diferentes “coisas”. Por exemplo:

import numpy as np
import magnet3Dpolomag
import pytest
import math

@pytest.fixture(scope='module')
def run_model():

    m = magnet3Dpolomag.Magnet3DModel()
    m.run()

    return m

def test_can_access_magnetic_profile(run_model):

    m = run_model
    # executa mais instruções para simular o modelo

    phi_profile, B_profile = m.get_profile_data()

    assert (
        np.isfinite(phi_profile).all() and 
        np.isfinite(B_profile).all()
    )

@pytest.mark.parametrize(
     'result',
     [
         "Demagnetized fraction[%]",
         "Saturated fraction[%]",
         "V_gap[l]",
         "V_magnet[l]",
         "V_demag[l]",
         "V_magnetic_steel[l]",
         "V_sat_magnetic_steel[l]",
         "V_stator[l]",
         "V_rotor[l]"
     ]
 )
 def test_access_results(self, result, run_model):
    m = run_model
    r = m.get_results_series()[result]

   assert ( (math.isfinite(r)) and (r >= 0))

A função no início é uma fixture que simplesmente cria e executa o meu modelo e retorna esse objeto, já povoado com os dados de simulação. Essa função é decorada com pytest.fixture, com um argumento scope que define que ela é executada por módulo. Ou seja, para todos os testes que usam essa fixture e que estão definidos nesse módulo (script), o modelo só é executado uma vez e passa o seu estado para todos os testes. O primeiro teste mostrado repete a lógica do exemplo da seção anterior; o segundo é outro exemplo onde quero testar que uma função que retorna uma Series tem de fato todos os registros. Essa função é decorada com pytest.mark.parametrize, onde especifico que o parâmetro result da função de teste assume cada um dos valores especificados na lista. Quando é invocado, pytest faz o loop automaticamente, chamando esse teste tantas vezes quantos são os elementos da lista que define o parâmetro.

Conclusões

Leitores podem estar confusos com a quantidade de informações técnicas. Peço desculpas (mas não muitas); esse post foi a melhor maneira que eu encontrei para consolidar todo meu aprendizado recente no assunto.

O que os leitores acham de textos nesse estilo?

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Por Fábio Fortkamp

Pai do João Pedro, Marido da Maria Elisa, Professor do Departamento de Engenharia Mecânica da Universidade do Estado de Santa Catarina, católico devoto, nerd

3 respostas em “Uso básico de pytest e suas fixtures”

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